ESTRATOS: 9 - A península flutua por si própria...
Cá fora, com os pés firmes no chão, olhando os horizontes, ou do ar, onde infatigavelmente as observações continuam, a península é uma massa de terra que parece, insista-se no verbo, parece flutuar. Para que flutuasse seria preciso que se tivesse desprendido do fundo, caso em que inevitavelmente iria parar ao mesmo fundo desfeita em torrões, porque, mesmo supondo que nas circunstâncias agentes a lei da impulsão se cumpriria sem maior desvio ou vício, o efeito desagregador da água e das correntes marítimas iria, progressivamente, reduzindo a espessura da plataforma navegante até por completo se dissolver a placa superficial. Portanto, e por exclusão de partes, havemos de concluir que a península desliza sobre si própria, a uma profundidade ignorada, como se horizontalmente se tivesse dividido em duas lâminas, a inferior formando parte da crosta profunda da terra, a superior, como se explicou já, escorregando lentamente na escuridão das águas, entre nuvens de lodo e peixes assustados
(…)
Até agora, e inexplicavelmente, a ninguém do comum ocorrera que a península pudesse estar a escorregar sobre o que fora seu milenário soco.
in A Jangada de Pedra, de José Saramago (Ed. Caminho, 1986, 12ª edição - Janeiro, 2001, pp.136-137)
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Até agora, e inexplicavelmente, a ninguém do comum ocorrera que a península pudesse estar a escorregar sobre o que fora seu milenário soco.
in A Jangada de Pedra, de José Saramago (Ed. Caminho, 1986, 12ª edição - Janeiro, 2001, pp.136-137)
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