ESTRATOS: 11 - Quanta riqueza...

A plataforma continental foi minuciosamente examinada, sem resultado. (…) O Archimède, obra-prima da investigação submarina, manipulado pelos franceses seus proprietários, baixou aos máximos fundos periféricos, da zona eufótica para a zona pelágica, e desta para a zona batipelágica, usou faróis, pinças, apalpadores electrónicos, sondas de vário tipo, varreu o horizonte subaquático com o sonar panorâmico, em vão. As longas vertentes, as escarpas declivosas, os precipícios verticais, exibiam-se na sua soturna majestade, na sua intocada maravilha, os instrumentos iam registando, com muitos cliques e luzes a acender e a apagar, as correntes ascendentes e descendentes, fotografavam os peixes, os bancos de sardinhas, as colónias de pescadas, as brigadas de atuns e bonitos, as flotilhas de carapaus, as armadas de peixes-espadas, e se o Archimède transportasse no seu bojo um laboratório apetrechado com os necessários reagentes, solventes e mais tralha química, individualizaria os elementos naturais que estão dissolvidos nas oceânicas águas, a saber, por ordem decrescente de quantidades, e para abono cultural de uma população que nem sonha existir tanta coisa no mar em que se banha, cloro, sódio, magnésio, enxofre, cálcio, potássio, bromo, carbono, estrôncio, boro, silício, flúor, árgon, azoto, fósforo, iodo, bário, ferro, zinco, alumínio, chumbo, estanho, arsénico, cobre, urânio, níquel, manganésio, titânio, prata, tungsténio, ouro, que riqueza, meu Deus, e as faltas que temos em terra firme, só não se consegue alcançar a fenda que viria explicar o fenómeno que, aos olhos de toda a gente, afinal, se produz, patenteia e prova.

in A Jangada de Pedra, de José Saramago (Ed. Caminho, 1986, 12ª edição - Janeiro, 2001, pp.138-139)

Comentários

Mensagens populares