A Praça da Discórdia - II

A Praça da Discórdia contém em si mesma a Praça da Concórdia.
Em qualquer dos momentos, algo não está bem.


A não-Praça

(Estava para lhe chamar Praça Anónima, Praça Lda., ou Praça S.A., mas nunca Praça Anarquista (o Anarquismo tem leis, que mania...!!) nem Praça da Anomia (porque a ausência de Lei traduz, em si mesmo, uma tendência, uma vontade e um objectivo...)


Nas construções humanas não há neutralidade possível.
Como aquando da formação das rochas, nelas ficam gravadas as polarizações magnéticas (nos seus minerais): no lugar e no tempo em que lhes damos existência (forma e conteúdo).



Este vídeo e a escolha deste, e não outro, não são por acaso.
Desengane-se quem não nos vai conhecendo (e é para que nos conheça melhor que o dizemos...), quem pensa que as coisas caem do céu: em todas as construções humanas (um livro, um filme, uma escultura, uma pintura, uma canção... este espaço) há propósitos e valores, significados e alusões, vontades e partilhas, estéticas e éticas.

Estarmos bem onde não estamos traduz a inquietação que pode ser energia que faz girar a roda da vida.
E também nós somos vida.

Este vídeo retrata um espectáculo musical de fim de ano.
Local: Terreiro do Paço, Lisboa.

A música pode ser como as árvores: para todos.

Perguntemo-nos há quanto tempo uma Praça não é tomada pelas pessoas.
Sim, organizada pelo Município, é certo (e já lá iremos).
Mas para as pessoas.

Os usos que fazemos das Praças determinam a Praças ou Não-Praças que vamos tendo.

É frequente no largo do chafariz (talvez a mais calcorreada Praça da cidade de Braga) ser ocupada por espaços - quais palanques mais ou menos dignos - com fins comerciais: seja através das tendinhas do bem-dito "Comércio tradicional" ("Compro o que é nosso", etc, etc.), seja através da exposição de automóveis de uma dada marca ou dado vendedor das redondezas.

Porque o Público é bem mais modesto e bem menos exibicionista que os Privados: passa por lá e vai usando-o à sua vontade. Mesmo que, em última análise, à sombra do bastão repressivo (Lei e Instituições): os miúdos andam de monopatim (mais conhecido por skate, ou squeite) ou bicicleta, pessoas reflexivas caminham de um lado para o outro, turistas contemplativos tiram as suas fotos, os mendigos pedem as suas esmolas, os artistas (se os há...) exibem a sua arte...

Deixem-no ser!
Deixem-nos ser!
Deixem-nos existir, deixem exprimir-nos.

Não me venham com gritarias nem propagandas visando o lucro.
Nem o lucro das vossas ideias, nem o lucro directamente comercial.

A Praça não será nunca um ente privado: nesse dia, estaremos mortos.
A Praça não pode ser Privada: não será Praça: apenas poderá ser sonegada, abandonada, cercada.



Em qualquer caso, mais cedo ou mais tarde, e talvez mais tarde que cedo, a Praça será questionada: será Praça.

Os campos de concentração (anti-Praças renascentes da História) dos corpos maquinais e formatados existem espalhados em cada canto de nós, se somos um mero produto de consumo.

Em qualquer caso, a Praça será transferida.
E se no-la negarem, rebentará por todos os lados.
E a Praça sairá à Rua num dia assim.

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