A Praça da Discórdia - I

A Praça da Discórdia contém em si mesma a Praça da Concórdia.
Em qualquer dos momentos, algo não está bem.


A Praça da Concórdia


Como Tú, León Felipe


A Praça, tal como a Cidade, a Pólis, é uma construção.
E uma construção humana.

Todos os seus elementos, vejamo-los, entrevejamo-los, invejemo-lo ou não, têm (pelo menos) um significado, uma função, um propósito ou uma decorrência.
Porque a Praça é uma construção os seus elementos são também um produto.

A diversidade de elementos numa Praça pode traduzir a incorporação de vários eventos a que assistiu, de que foi palco, de que foi actriz.
Pelo contrário, a rarefacção de elementos numa Praça pode, pela ausência deles,
(e na consciência e na memória de quem vê o que nela devia estar, podia estar, e não está -porque dela foi retirado ou nela não quisemos colocar),
traduzir a não incorporação (o não interesse, o menosprezo, a indiferença, a desmemória... a neutralidade?) desses mesmos eventos de que foi palco e actriz.

Uma Praça é o uso que dela vamos fazendo.
E uma Praça é de quem a usa.

Portanto, QUEM
(A
Usa
?)

Uma Praça tem uma dimensão.
Imaginamos praças com as suas paredes e limites (edifícios e/ou fronteiras) lá longe, muito ao fundo. É isso uma Praça? Pode ser.

Imaginamos concentrações perigosas (atribuímo-lhes significado e valências) de uniformes, maquinalmente orquestrados e alinhados, já não numa mole humana surpreendente mas numa quantidade de carne para canhão.
Disposta, portanto, a morrer sem Razão, como canta o Vandré.

Imagem passada daqui

Há soldados armados,
armados ou não.
Quase todos perdidos
de armas na mão.
Nos quartéis lhes ensinam
uma velha lição
De morrer pela pátria
e viver sem razão.

Para não dizer que não falei das flores, Geraldo Vandré


Por outro lado, imaginamos o vazio urbano do espaço desaproveitado da Praça.
Mas ela está lá. Disponível. Potencial. Pronta a rebentar em vida e abraços.
Se a soubermos habitar de sorrisos e flores.
Se nos soubermos habitar, uns nos outros.

A Praça da Concórdia é construirmos aquilo que é nosso: a entre-ajuda na diferença.
Amar é um acto político irrenunciável.
A política é a luta de valores, por valores.

A Praça é o símbolo da Partilha, não da Bastilha.
Praça é confrontação, é discussão, é devir.
Praça é um lugar onde temos de plantar árvores para que uma criança corra à sua volta, se esconda atrás dela. Para que uma criança, cansada de brincar com a bola que é o seu mundo, descanse a cabeça e veja o sol, se aqueça ao sol.

A árvore é o paradigma anti-privatização.
Da vida.

A Lei da Terra é onde renascemos, enraizados àquilo que somos e àquilo que nos faz sermos o que somos: vida.

As Praças da Canção é onde nos afirmamos e onde, lutando, descansamos do cansaço de não nos cansarmos do descanso.

Há-as por aí, em muitos lugares: basta procurarmo-las juntos, tu e eu.

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