Estes estranhos nomes... (III) (continuação)

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Foto: António J. M. Correia


Há alguém que sabe se há ou não um lugar chamado Não Há? Na edição de 1889 do Dicionário Chorographico de F. A. de Mattos, há. Há um Não Há na freguesia de Cardosas no concelho de Arruda dos Vinhos. Na recente edição do Novo Dicionário Corográfico é que não há Não Há. Como é que deixaram desaparecer esta terra? Será que nunca houve Não Há? Ou será que ainda há? Nem se pense que o nosso carolliano niilismo onomástico fica por aqui, porque também houve, algures, um lugar chamado Nenhures. A fonte consultada, uma obra de Fausto Caniceiro da Costa, não diz onde fica. Se calhar nem sequer fica em Cascos de Rolha, que também não existe. (Escusado será dizer que nas últimas edições do Dicionário Corográfico não vem Nenhures em lado nenhum).
Se já não há Não Há nem Nenhures, talvez ainda haja Talvez, na freguesia de Vidais, no concelho de Caldas da Rainha. Tanto Não Há como Talvez aparecem no Dicionário Corográfico de 1889, mas não no de 1981. Há Talvez ou Não Há? Ou não há nem um nem outro?

Começo assim para não começar logo a falar em Picha. Não queria falar dela. A semana passada consegui chegar ao fim da crónica sem referi-la. Porém, a insistência de uma mão-cheia de leitores atentos, informados e boçais, forçaram-me a mencionar o notório lugarejo, vergonha eterna da freguesia e concelho de Pedrógão Grande. Espanta-me como os visitantes continuam sem se revoltar. Parece impossível que se percam nomes engraçados como Não Há, Talvez e Nenhures, todos de bom recorte literário, e se persista teimosamente em manter o nome deste lugar. Já em 1942, um estudioso local, um Frei Humberto, escrevia no seu opúsculo O Nome da Picha, que era tempo de altertar as autoridades no sentido de mudar o nome para qualquer coisa menos ofensiva, como Pénis, por via erudita, ou, por via popular, Pilinha.

Picha tem as casas mais baratas do país, só porque os potenciais residentes são incapazes de enfrentar uma morada tão rasca. Não é um nome que torne distinto um cartão de visita. Mesmo com uma nota de rodapé a explicar que picha significa “galheta; ou cartão pequeno”. Imagine-se também o incómodo do viajante que se ponha a caminho e seja obrigado a pedir indicações para lá chegar. Sujeita-se a que o mandem para o sinónimo.
Se fosse um caso isolado, passaria. Infelizmente, não é. Nem quero pensar na trabalheira e no embaraço dos nossos nobres e honrosos tradutores e intérpretes da CEE, ao procurar equivalentes nas outras línguas europeias (como se diz Não Há? Il n’y a Pás? No Such Place?).
De facto, para além de Picha, Portugal conta igualmente com dois lugarejos denominados Venda da Gaita. Uma fica em Almoster e outra em Tomar, e isto não pode continuar assim.


(Prosseguimos com a divertida e informativa crónica de MEC, extraída da compilação "Explicações de Português", 2ª ed - Novembro de 2001, Assírio & Alvim, pp. 231-241.)

Comentários

Anónimo disse…
http://www.ff.uc.pt/~rmatos/panodopo2/RC/Picha.jpg

Associação de Melhoramentos, Cultura e Recreio de Picha

Picha
3270 - 143 Pedrógão Grande

Área de actividade - Cultural/Recreativa
Rogeriomad disse…
Caro amigo...

Pode explicar-me o porquê do "Melhoramentos" no nome dessa associação?

Em que sentido é aplicada a palavra melhoramentos?

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