O cheiro a napalm pela manhã




Entretanto, prosseguimos na senda das revelações, como se estes tipos que por lá andam e que nos pastoreiam, insisto neste ponto, não soubessem ao que vinham, quer dizer, mesmo sendo uns cepos irresponsáveis e incompetentes, o trabalhinho que lhes estava destinado terá que ser concretizado, e esse passa por desmembrar o tecido social, aniquilando a vontade e a capacidade de reacção. Em suma, tornar-nos uns pedintes, individualmente, egoisticamente, mas ainda assim uns pedintes.

No Expresso de ontem, Pedro Adão e Silva fala de “napalm social”, e já não é o primeiro a recorrer a analogias explosivas, acrescentado: “Não sabendo onde cortar, o governo acabou por poupar, com desvelo pornográfico, na protecção aos mais desfavorecidos: pobres, idosos e desempregados. Esta opção não é politicamente neutra [olha a novidade]: enquanto se degrada a rede de mínimos sociais, empurrando milhares de cidadãos para abaixo do limiar da pobreza, vamo-nos aproximando de um passado onde a fome a indigência social eram o último recurso dos desempregados. Quando temos um mercado de trabalho profundamente deprimido, é caso para dizer: bem regressados à barbárie social”.

Tudo isto é certo, mas sendo aparentemente profundo, não sai ainda da superfície, da epiderme do problema global. O canastro das pessoas é duro. O objectivo vai além, mais fundo, visa a (suposta) dinamização que eles tanto falam do mercado de trabalho, assente na pedinchice, assente na miséria de ter de aceitar qualquer coisa, a qualquer preço, assente na necessidade última da sobrevivência da prol, na destruição do valor do trabalho, enfim, dos direitos legítimos conquistados ao longo de décadas. E assente, por fim, na liberalização perfeita e no enchimento dos bolsos de uns poucos que controlam o processo. Pelo caminho, estarão dispostos a aceitar algumas - recorrendo ao eufemismo - baixas. Talvez seja isso, afinal, a denominada (ninguém notará o paradoxo?) guerra preventiva.   

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