Eles é que mandam (I)



Vêde como nos manipulam a cabeça dos milhões de telespectadores portugueses com a construção de uma peça idílica, suave, com musiquinha a condizer com a vida que os altos gestores gostam de ouvir.

"Na EDP, cuidar do meio-ambiente (1), proteger as espécies em extinção (2) e melhorar a qualidade de vida das pessoas (3) faz parte da nossa missão."

Legenda:

(1) - Mentira sem vergonha.
(2) - Estão a brincar, não?.
(3) - Enorme treta (ou "carece de especificação").


O Movimento Cívico pela Linha do Tua emitiu ontem o seu comunicado (clique para ler) em resposta à publicação da Declaração de Impacto Ambiental da Barragem do Tua.

Segundo o mesmo, "O Estudo de Impacte Ambiental, que conclui da forma mais categórica possível que a barragem trará “impactes muito negativos ao nível da economia local, em particular para agricultura e agro-indústria, com repercussões também muito negativas ao nível do emprego e dos movimentos e estrutura da população”, numa região que “não facilita o estabelecimento de percursos tradicionais de transporte colectivo rodoviário".

Mais, com a barragem "vai-se destruir um património ferroviário e paisagístico único que tem um contributo fundamental para a economia de uma região já muito marginalizada. (...) São estas paisagens, e não as associadas a mais uma albufeira como tantas outras, que têm a capacidade de potenciar o turismo e o emprego na região." (do comunicado do BE)

Como é da natureza intrínseca do modelo de "desenvolvimento" capitalista, que apenas cresce baseado nas desigualdades (económicas, em primeiro lugar; depois tudo o resto vem por arrasto, até cadáveres), é tudo a remar prò mesmo lado, esvaziando de poder de decisão, de fixação e de atracção as regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos do litoral.

Portanto, a enorme mentira (3) cai por terra. A não ser que com "pessoas" estejam a referir-se aos accionistas da empresa. Os que não contam seriam, por conseguinte, mais umas bestas que nem já carga sabem levar.

Mas há mais, o tal desenvolvimento que professam, tal como já o dissemos em relação à barragem do Sabor (recorde-o aqui), com a contribuição que dá à produção energética nacional - um ridículo número de 0,5%! - estou mesmo a ver que vai chegar às populações directamente afectadas.

"Que desenvolvimento advirá para a região, quando edis como o de Montalegre e de Miranda do Douro, com 5 e 2 barragens respectivamente, não recebem da EDP nem o suficiente para pagar a iluminação pública dos seus concelhos? Como poderá o Turismo sair beneficiado com mais outro espelho de água e com a perda de valores genuínos e únicos?"

Portanto, o ponto (3) é indefensável.

Mas também as mentiras vergonhosas, grosseiras e ofensivas dos pontos (1) e (2) (protecção do meio-ambiente e das espécies em extinção) não têm qualquer sustentação:

"Que medidas poderão proteger da extinção os 19% de espécies de vertebrados e as 14 espécies de aves presentes no Tua com estatuto de ameaçados, e da destruição os habitats de leito de cheia, que agregam 20% das espécies RELAPE de Trás-os-Montes?

Uma das mais basilares opções de desenvolvimento sustentável é a da defesa dos habitats. É lá que os seres vivem. Sim, e isso inclui-nos. Sem habitats - como não perceber este argumento gritantemente óbvio?? - não há possibilidade de vida.

Com as barragens e grandes extensões de habitats submersos há destruição de tudo isso. Sim, pode haver adaptação de alguns seres vivos. Mas não queiramos comparar uma adaptação biológica obrigatoriamente repentina com o tempo de evolução que as espécies tiveram de percorrer para chegarem ali - ao seu estádio de desenvolvimento - e até aos nossos dias.

Arrumados que ficam os pontos (1) e (2) pergunto-me ainda porque se referem a "espécies em extinção"? Haverá alguma relação entre as obras da EDP e o triste "estatuto" dessas espécies?

Uma última anedota é a que sempre vem associada a estas opressões: o número de 75 anos de gestão das reservas da água por parte da EDP. 75 anos...

Sem mais comentários.

Eles (a minoria) é que mandam
e nós (a maioria) é que temos de suportar.

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