Da instabilidade (e) dos mercados (e do ensanguentamento, orgulhoso, das mãos com luvas)



Público em linha, hoje, 22.07.13


Crises há muitas, e nós somos os palermas.

Parece que a convocação de eleições antecipadas representa instabilidade para os países. 
Ah, correcção, para os mercados.
Que, interligados e anónimos, não são nacionais. 
Não só, nem tampouco nacionais.

Donde se depreende que a economia e as finanças (mundiais e de trazer por casa) são inimigas da Democracia.

A Democracia, essa rameira à força, funciona.
Ponto final.
Funciona até ao momento em que vais testá-la.
Por exemplo através de eleições.
Ou de alguma petição para alterar alguma coisa que inverta o processo de desapossamento de muitos engendrado por uns quantos.

Mas... e porque seria o contrário (o desapossamento de uns quantos pelos muitos) mais legítimo?, poderiam os statusquoístas contra-argumentar, inquinando a reescrevendo toda a História e cartesiana filosofia de ser da Democracia.

Mas a questão, já falámos dela até à ponta dos cavacos.
Mesmo assim é mais importante que a nova ministra oculta ir mostrar o buraco, segundo a bela prosa e óptimos directores do Jornal de Notícias.

A instabilidade é, portanto, inimiga dos negócios.

E é aqui que se demonstra como Portugal é um país atrasado.
Porque em países mais avançados (avançados porque já passaram por esta fase) souberam as empresas fazer negócio com instabilidade.
Correcção: "...fazer negócio com A instabilidade".

Passa um anúncio a dizer o seguinte:
"Os estudos mostram que tem havido uma subida de assaltos a casas."
(Solução?)
"Agora existe o vero não sei quantos (lá o que dizem os lábios da menina espanhola cujos contornos, dos lábios, não coincidem com a fala que ouvimos), o sistema de segurança que protegerá a sua méson dos larápios.

Dos larápios à moda antiga, especifique-se.
Mas na publicidade tudo é superficial, desde os sorrisos ao convencimento.

Donde se depreende que... a insegurança é boa para o negócio.
Pelo menos para este.


E a the next big idea vem da parte de um moço que, acelerando o processo que existe na natureza e que produz o inquinamento que está a arruinar o mundo, mais conhecido por petróleo.

Para isso, pega-se em biomassa, coloca-se esta num reactor, retira-se-lhe a humidade e o resultado, líquido, é um composto muito semelhante ao crude, que pode, diz o jovem de trinta anos, ser refinado com os convencionais processos usados por qualquer petroquímica do mundo.

Mas, alto, então vão pegar em biomassa verde e transformá-la em petróleo?
Calma.
Mas quem disse que era biomassa verde?
O lado bonzinho é que esta nova forma de fazer dinheiro se insere já na economia da catástrofe: a biomassa usada para tal é proveniente dos matos ardidos - ou seja, uma coisa que acontece naturalmente todos os anos em Portugal, como todos nós sabemos.
Correcção, uma coisa que acontece normalmente todos os anos.

Donde se depreende que os incêndios são, também nesta nova variante de aproveitamento, bons para o negocídio.
Pelo menos para este.


Numa Visão muito recente falava-se da extracção de petróleo por fracturação hidráulica. E que, assim, há imensas reservas à espera da nossa ganância. Incluindo na China, território delimitado enorme.

Termina o artigo o excelente propagandista a dizer:
A questão é a de saber se ainda vamos a tempo... 
A tempo para fazer baixar o preço do petróleo.

Isto é, andamos prà'qui entretidos a discutir as alterações climáticas, a perda de biodiversidade, de habitats e de espaços húmidos, a poluíção atmosférica, os problemas de saúde, os refugiados ambientais, os derramamentos de petróleo, a escassez e os conflitos pela água, os milhos transgénicos, que vão salvar o terceiro (mas só o terceiro...) da fome...

Espera, nós não estamos a discutir nada disso...!
(andamos entretidos com a crise)

Mas... e o artigo não menciona uma única palavra sobre os devastadores danos ambientais que tal extracção de petróleo implica.
E andamos nós a tentar mudar de paradigma e este tipo de propaganda, o que lhes interessa, é continuar a formatar os leitores informados para que alimentemos este, destruidor e a ultrapassar urgentemente.

Só falta depois criarem empresas especializadas na limpeza (se esta fosse possível) da porcaria que as perfuradoras deixam para trás.
Limpeza paga em nome de todos, paga, portanto, por todos, a essas empresas, então, entretanto criadas.

Andamos a tapar o sol com a peneira. Rota.



As empresas de reconstrução após a catástrofe têm muito a ganhar.
Porque alguém tem de a pagar.
Porque alguém tem de lhes pagar.
A elas compete-lhes fazer o melhor serviço.

As empresas de reconstrução após as guerrinhas, travadas lá longe das suas sedes, têm muito a ganhar.
E se ganham muito, depreende-se que essas guerrinhas são boas para o negóciozinho.
Donde se depreende que, quantas mais, melhores as cotações nos mercados.
Mercados anónimos, negócios locais com chupismos de todo o lado, e vítimas globais que apenas (poderia ser doutra forma?) se manifestam a nível local.

O passo seguinte é piorarmos a visão e num momento da deslucidez para que o desespero nos empurra é depreendermos que também as catástrofes naturais (sismos, maremotos, queda de diques, Katrinas, etc.) são provocados.
Porque tudo o que for bom para o negócio tem muita força.

Portugal está a habituar-se à instabilidade há já alguns anos e as empresas estão a adaptar-se a isso.
E assim, todos os valores impostos, que são as empresas que mandam enquanto não mandarmos nós (que, por coincidência, trabalhamos nelas ou, menos, para elas) são invertidos e as sociedades passam a caminhar de costas para a frente.

Belo futuro!
Troca de favores: garantimo-vos o nosso presente em troca do futuro que prometeis para nós.

Contai com todos os cavacos mercadológicos para no-lo assegurarem.
A todo o custo.

O sangue é um osso do ofício.
Correcção: o sangue dos outros é um osso do ofício.
As mãos, com mestrado tirado nas melhores universidades internacionais, estão preparadas para lidar com os o brilhantismo dos açougues e e dos carniceiros.


Ah! Tal sistema e tais processos não são sustentáveis.
A corrupção é um beco, pois que se come por dentro, enrolada nas trapalhadas que cria.
Aceleremos isso, não pactuando com ela, ou infiltrando-nos nela e explodindo-nos, kamikaziamente, com ela.

Mas continua a ser tarde...
Somos os palermas de antanho.


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