Tertúlia: Nova Lei da Docência

A tarde ia ser longa...

O Prof. Baptista colocara algumas questões à Georden e os seus membros reuniram-se à mesa para discutir sobre a matéria, da qual não estavam a par. E a conversa iria começar mesmo por aí:

Vidal - Ei pessoal, ouviram falar da nova lei da docência?
Eduardo F. - Existe uma nova lei? Boa…
Rogériomad - A anterior não servia?
Eduardo F. - Que sabes tu da anterior?
Rogériomad – (…)
Vidal - Este país está a saque! Ninguém sabe de nada, ninguém se interessa por nada!
César - Ei, ei! Calma aí! Vamos lá ver de que é que trata isso, então…
Vidal - Bem, o professor Baptista começa por perguntar “se um candidato no final do Secundário que queira ser professor de Geografia para o 3ºCiclo e Secundário terá obrigatoriamente de ser professor de História e de Geografia?”
Vá, toca a ler isso!

E ficaram algum tempo ensimesmados na lei em questão (o Decreto-Lei nº 43/2007, de 22 de Fevereiro). Passada quase uma hora de silêncio (inexplicável para outros frequentadores daquele bar…), o Rogériomad afirmou repentinamente: - Qual era a pergunta?

Eduardo F. - Está escrita ali, vê-la?
Rogériomad - Ah, ok. Com uma letra destas não chegava lá…
Eduardo F. – (...)
César - Pessoal, acho que o que o Prof. Baptista pergunta está escrito aqui. Reparem. Se alguém pretender ser professor de Geografia terá de concluir os 120 créditos no conjunto das duas áreas disciplinares (História e Geografia) e nenhuma com menos de 50 créditos. Os recém Mestres ficam habilitados a leccionar Geografia e História, no 3º ciclo do ensino básico e ensino secundário. Não ficam obrigados a leccionar ambas as disciplinas, apesar de estarem habilitados para tal. Poderão optar por uma das disciplinas. Pelo menos é como eu interpreto isto…
Eduardo F. - É, também fiquei com essa ideia…
Vidal - Está assente? Mesmo? Então passemos à pergunta seguinte. Vou ler: “Se assim for, teremos daqui a 5 anos alunos que saem da Faculdade com o grau de Mestrado (Processo de Bolonha) com 120 créditos no conjunto das duas áreas disciplinares que lhes irá permitir leccionar nos dois grupos disciplinares.”
Eduardo F. - Sim, correcto. Faço a mesma interpretação. Estarão habilitados a leccionar Geografia e História.
Rogériomad - O que me parece bem.
Vidal - Isto estaria cada vez pior se cada um só percebesse da sua área, aliás, nem faz sentido! Quer dizer, já é tão difícil manter uma boa conversa…! E depois isso passa para os alunos. Cada vez mais, se não soubermos onde estamos e de onde vimos, então não andamos cá a fazer nada de jeito…
César - Sim, concordo contigo. Tu sabes o que andas cá a fazer?
Vidal – (...)
Eduardo F. – Próxima: “Como tal não será descabido dizer que no Ministério de Educação já terá pensado que num futuro próximo o destino da disciplina de Geografia no 3º Ciclo e Secundário será o de desaparecer para dar lugar a uma nova disciplina de História e Geografia, ou seja, uma possível fusão das duas disciplinas agora separadas.”
Eduardo F. - Calma aí! Não sei onde isso esteja escrito. Talvez seja uma suposição do professor. Através do Decreto-Lei em questão, não se percebe se essa será uma intenção do Ministério. Não temos informações para julgar o mesmo, ou para termos a certeza de que isso vá ocorrer….
Rogériomad - Eu acho que tal nunca devia acontecer (pelo menos, assim o espero). Desconheço a intenção do Ministério, mas é totalmente descabido fundir as duas disciplinas. A Geografia e a História complementam-se. O mesmo acontece nas referências 6, 7, 12 e 13. Será que a Biologia irá fundir-se com a Geologia?
Por outro lado, uma possível fusão da Geografia com a História, no 3º Ciclo e Secundário, devia ser feita, não através de juntar matérias numa só disciplina, mas sim em criar um grupo de trabalho de Geografia/História. Os professores dessas disciplinas deviam trabalhar em sintonia, e certas matérias deveriam ser leccionadas em conjunto. A Geografia seria enriquecida com a História, e vice-versa.
Um exemplo, a História necessita de cartografia para localizar acontecimentos. A Geografia necessita de dados/factos históricos para assinalar avanços temporais dos fenómenos físicos, biológicos e humanos na superfície terrestre.
Os professores resumem-se a "devorar manuais pré-concebidos". O lema é: "O programa está estipulado, vamos cumpri-lo com o menos trabalho possível".
Dá a sensação que não têm formação universitária, ou então, perdem-na rápido. Perdem rápido a noção do academismo, da investigação, do debate, da troca de ideias que tiverem durante largos anos da Universidade/Faculdade.
A docência arrefece e adormece. As matérias rotineiras ajudam a isso.
No ensino básico e secundário, os professores apenas convivem na "sala/bar deles".
Debater temas em conjunto com os alunos é raro. Cativar os alunos com aulas dinâmicas/inovadoras, também é raro.
Óbvio que há excepções, mas são raras.
No secundário onde estão as tertúlias? Conferências? Palestras? Saídas de campo?
Todos nós sabemos que as Universidades abrem as suas portas às secundárias. No entanto, por haver determinado professor carrancudo ou um director de turma pouco organizado e mal informado, os seus alunos não entram nessas portas. O que é péssimo para todos.
Talvez tenha fugido um pouco do centro da questão, mas o que me incomoda não é a fusão das disciplinas, mas sim a incapacidade dos professores de as tornar "disciplinas vivas (acordadas) e não mortas (adormecidas)". Talvez seja trauma do passado.
Vidal - Concordo contigo. Muitas vezes não fazem ideia, ou têm uma imagem distorcida e redutora da geografia, desde muito jovens. Isto afasta-os, reduz a disciplina a um "isto não serve para nada" ou a um facilitismo exagerado. A solução passará pela abordagem inicial e pelo contacto. Na realidade esconde uma das facetas mais típicas de alguns professores: O deixa andar, a matéria está dada... não acompanha, a mais das vezes, a realidade actual nem compara (ou complementa) as outras disciplinas. Por isso atrevo-me a dizer que grande parte dos alunos do secundário não faz grande ideia do que será essa tal de "geografia", nem os caminhos e as possibilidades desta. Logicamente isto terá efeitos no futuro da disciplina, porque existe uma "imagem" no espaço cognitivo dos cidadãos distorcida e "irreal". Mesmo em IDES (12ºano) cujas matérias são muito interessantes e pertinentes existem desvios que quando bem esclarecidos e debatidos com o aluno, este parece que fica fascinado e interroga "não sabia que isto era ou podia ser assim"?
César – O que estão a falar descai já para a última questão que ele nos coloca: “Se assim for, eu pergunto qual vai ser o destino de todos os professores de Geografia que, assim como eu, têm somente habilitações académicas para leccionar Geografia? Será que teremos que fazer num futuro próximo os restantes 60 créditos relativos à disciplina de História? Ou, o Professor de Geografia, num possível cenário de fusão dos grupos disciplinares, continuará somente a leccionar Geografia e assim sendo apesar dos professores de História e Geografia fazerem parte do mesmo grupo de recrutamento cada um dará as aulas na sua disciplina (fusão dos professores num só grupo mas não nas disciplinas, tal com aconteceu com os colegas do 6º e 7º grupos).”
Eduardo F. - Na minha opinião, a ocorrer essa tal fusão, será obrigatório para os professores obterem esses créditos. Mas atenção, pois essa obrigatoriedade decorre, somente (como está disposto no nº. 1 do artº 26º - "Aqueles que adquiriram habilitação profissional para a docência no âmbito de legislação anterior à entrada em vigor do presente decreto-lei mantêm essa habilitação para a docência no domínio em que a obtiveram "), para os candidatos a mestre já no ano de 2007-2008. Foi este o meu entendimento.
Rogériomad - Sem dúvida que esse tal n.º 1 do art.º 26, responde às duas questões. Quanto ao destino, "um professor de Geografia hoje continuará a sê-lo amanhã." E na minha opinião, "o professor de Geografia deve ser reciclado para ser reutilizado". Quero com isto dizer que a Geografia como ciência evolui logo os professores de Geografia devem acompanhar essa evolução.
E, seria assim tão mau para um professor de Geografia fazer 60 créditos relativos à disciplina de História?
Vidal – Fazer créditos para fazer História? Por que não? O professor de Geografia e o Geógrafo deve reciclar, deve complementar a sua formação o melhor possível e adaptar-se, não ser "monocultura". Aliás, como professor, em essência, não poderia ser outra coisa.
E aproveito, desde já, para lançar outras questões:
Qual o futuro de se apresentar a concurso com "habilitação própria"? É o nosso caso. Pessoalmente concorro há dois anos sem problema algum, e este ano já verifiquei a minha password para o concurso e funciona. Concorro com a média final de curso e sem tempo de serviço. O ano transacto não entrei na fase de contratação por muito pouco. Qual o futuro do concurso com habilitação própria? Temos apenas que fazer os dois anos dos 2ºciclo? Ou as respectivas cadeiras pedagógicas, como anteriormente?
César – Bem, Posso mandar vir mais uma rodada? Ei! Aonde vais?
Vidal – Vou ver se apanho as canas dos foguetes que acabei de lançar...
Eduardo F. e Rogériomad – Mas volta...

Passado um bom quarto de hora, Vidal chega chega esbaforido mas com a resposta na ponta da língua:

Vidal – O despacho do gabinete do secretário de estado da educação de 20.04.04, alude a um regime especial (não obstante o exposto no decreto lei 20/2006 de 31 janeiro) aplicável apenas até 2007/2008 (este ano lectivo) em que será possível a candidatura dos docentes com a habilitação própria, mas que não observam o período de tempo de serviço requisitado. Este último equivale a um mínimo de 6 anos, sendo que estes docentes com habilitação própria podem aceder à profissionalização. Em última instância trata-se do último ano em que o pessoal com habilitação própria mas experiência inferior a 6 anos pode concorrer.

E dito isto, avançou:

Vidal – Vamos aos finos, que isto de apanhar canas cansa...


Afinal, a tarde foi curta para tão longo debate...
Como narrador resta-me ir beber com eles...

“Venham mais cinco de uma assentada que eu pago já...”

Saudações geográficas

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