Isto faz de nós personagens?

Por todas as cidades é frequente encontrar uma ou outra placa toponímica homenageando escritores portugueses, uns porque aí nasceram, outros porque aí habitaram. Mas nunca o homenageado foi o próprio livro. E isso encontra-se em Pombal, ao longo de vinte e seis ruas, numa pequena biblioteca com vinte e seis livros. Imagine, caro leitor, o que é dizer aos seus amigos, quando lhes indica a sua morada, que vive na Rua das Gaivotas em Terra, referência ao primeiro romance de David Mourão-Ferreira, ou então no Beco d’Os Gatos, obra de Fialho de Almeida. Certamente ficarão estupefactos e lhe perguntarão, desconfiados, se é mesmo verdade. Pode acreditar. Mas ainda há mais. Por exemplo, a Rua d’A Musa em Férias, de Guerra Junqueiro, a Rua d’Os Adoradores do Sol, de Fernando Namora ou a Rua do Pranto de Maria Parda, de Gil Vicente. Uma verdadeira biblioteca de obras portuguesas se acha pelas ruas da cidade de Pombal, no centro do país.


Tudo aconteceu em 1996, quando em reunião de Câmara, a 4 de Outubro, o Município de Pombal deliberou as denominações toponímicas a atribuir para algumas ruas da cidade de Pombal e da Charneca, privilegiando os livros em si e não directamente os seus autores. Este será talvez o melhor elogio que alguma vez se realizou em Portugal em prol da nossa literatura. Seguramente será também uma boa promoção do livro e da leitura, tão importante nos dias da iliteracia de hoje. Quantos dos seus moradores não se terão já questionado sobre aquele livro que designa a rua onde habita e não terão partido à sua descoberta.


Não querendo pecar por míngua ou omissão, prefiro correr o risco de ser fastidioso mas deixar registado em letra redonda os livros que se podem passear por Pombal. Assim, encontramos, além das referidas, a Rua d’O Fidalgo Aprendiz (D. Francisco Manuel de Melo); a Rua d’Os Lusíadas (Luís Vaz de Camões); a Rua da Cartilha Maternal (João de Deus); a Rua Só (António Nobre); a Rua dos Emigrantes (Ferreira de Castro); a Rua d’O Monge de Cister (Alexandre Herculano); a Rua Menina e Moça (Bernardim Ribeiro). Na Urbanização da Bela Vista: Rua da Mensagem (Fernando Pessoa); Rua d’A Morgadinha dos Canaviais (Júlio Dinis). Na Urbanização de São Cristovão: Rua d’O Primo Basílio (Eça de Queiroz); Rua d’A Sibila (Agustina Bessa-Luís); Rua do Leal Conselheiro (D. Duarte); Rua d’A Sobrinha do Marquês (Almeida Garrett); Rua da Estrela Polar (Vergílio Ferreira). Na Urbanização da Senhora de Belém: Rua da Peregrinação (Fernão Mendes Pinto); Rua do Memorial do Convento (José Saramago); Rua d’Este Livro Que Vos Deixo (António Aleixo); Rua do Amor de Perdição (Camilo Castelo Branco); Rua do Orfeu Rebelde (Miguel Torga); Rua das Décadas da Ásia (João de Barros). E por fim, na Charneca, nada mais a propósito do que a Rua da Charneca em Flor (Florbela Espanca). Só mais um pequeno conselho, caro leitor. Antes de iniciar o seu passeio à descoberta da nossa literatura, vá munido de um sápido lanche. Procure pelas bandas do Largo do Cardal pelas queijadas da Ti Maria Rata ou pelos Cardalinhos, verdadeiros ex libris da doçaria pombalense. Vai ver que o passeio lhe sabe pela vida.

Paulo Moreiras
Escritor

Retirado do blogue da revista Ler

Comentários

Rogeriomad disse…
Interessante... já estive no Pombal e desconhecia de tal facto.
Pombalense disse…
No Pombal não!!! Em Pombal!!!

Relativamente aos nomes de ruas, é uma patetice pombalense. Tanta gente ilustre da terra que merecia nome de rua e nada!!!!

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