A poc a poc

A poc a poc els nens s'adormen
A poc a poc, Pi de la Serra 




Centro Paroquial e Social de São José de São Lázaro, Braga
Foto de Edward Soja, 15.11.2012


"Pouco a pouco", cantava o Pi de la Serra (e aqui o Serrat) a canção popular catalã, "os pequenos vão adormecendo".
Diz o Kundera (e o Anselm Jappe) que a sociedade assiste à infantilização.
Crianças a assistir a criançados.
(Há dias uma notícia dizia que proliferava na publicidade o tutubear - ou seja, apelar ao consumidor tratando-o por tu: coisa que vai no mesmo sentido do que aqui vamos falar).

O império da criança - não no que tem de sonho, liberdade etológica e inquirição descobridora - não veio para retemperar uma ameaça de insustentabilidade no sistema do mal-estar capitalista a cair no precipício do consumo "negativo" (consumo negativo ocorre quando era "esperado" que ele crescesse x e só cresceu y: isto é, cresceu menos, mas cresceu!).
Veio para afirmá-lo.
Depois da criança - já estamos a ver - não há mais nada.

Passamos a explicar.

A criança é o ser humano com menos memória criada.

Pronto, está explicada.
O bebé ainda não existe, praticamente.
O condicionamento de que fala o Huxley está em curso, por exemplo, nos cursos de inglês na pré-primária: quer dizer isto que, ainda antes de aprender Português, já estão - para uma integração plena na sociedade do futuro - a aprender outra língua.

A língua materna quer dizer o quê?

Aliás, com tantos ésse-éme-ésses como forma quase preponderante de comunicação - à distância e distanciada - dos nossos alunos até aos secundário (nem queremos ir mais longe), a língua sofre uma transformação que, noutros lugares, conseguimos apelidar de "crioulização".
Há piadas sobre os pais não entenderem o que dizem as mensagens dos filhos.
E chegam a casa e é toda uma nova aprendizagem para os entender e... controlá-los (que é isso a que chamamos educação, não é?)

- Atualiza-te, velhota!

(dizem eles - e nós - sem o "c")
(ah, repararam no "velhota" e escandalizaram-se, foi?
Pois, tudo é relativo, não foi isso que te ensinaram?)

A liberdade que associamos à infância - talvez devida àquela inocência que provém da falta de memória e esta de conhecimentos e, portanto, da capacidade de relacionar e formar juízos e "explodir" em ideias - é coarctada, no que aqui nos concerna, por exemplo, na limitação espacial.

O condicionamento ambiental é palpável, visível.
Só que, como vai sendo pouco a pouco, talvez nem nos apercebamos.
Às vezes, o que está mais longe dos nossos olhos é o que está mesmo à frente do nosso nariz.

Igreja e Creche de São Lázaro, via gúgal
(conservada para memória futura,
Se o mesmo paizinho gúgal assim o quiser. $alvé!)


O pátio onde gritavam e corriam - experienciámo-lo por diversas ocasiões - os miúdos no Centro Paroquial e Social de São Lázaro, que podemos ver na ainda disponível imagem de satélite do paizinho gugle (as perspectivas são distintas, mas permitem a comparação) ficará agora reduzido a insignificância. Apenas ao espaço em que já não faça sentido correr.
Apenas a uma área onde já não caibam todas as crianças na hora do recreio.
E brincarão lá dentro.
Talvez para um dia (esta é das nossas falácias predilectas!, a do "efeito bola-de-neve") estarem acostumadas a viver sem sol.
Como aliás já muitos "aprendem", obrigados, a "colaborar" (antigamente dizia-se "trabalhar"), dentro de caixotes que são autênticas cidades de consumo e destruição dos mundos além-olhos.

Com o turismo barato a crescer, normal é que aumentem e destruam mais espaço com aeroportos.
Mas, sob que pretexto estão a ampliar a creche?
Afixadas nos tapumes das obras - em todas - apenas nos informam do "quê", mas nunca do "porquê".

Como se tudo o que acontecesse tivesse que acontecer e tudo fosse irreversível ou irremediável.
E como se tudo pudesse acontecer e mudar com a condição de estarmos de acordo com os valores que presidem a essas mudanças.
E é por ainda não sermos todos crianças - elas não podem defender-se, e cada vez menos poderiam... - que não somos todos quadrados e encaixotados nas ideologias dominantes que nos fazem dizer
Amén.

Não somos todos gregos, nem somos todos troianos.
Eis porque os motivos são sempre a maçã das maiores discórdias.

Uma coisa é visível - estas mudanças têm impactos.
Nesses impactos não económicos não estão os patos bravos a pensar, que isso... "não é da sua competência"

(Eles só agem à maneira de empresas: visam o lucro.
E se mostrarem obra aos pacóvios, todos aplaudem o vício.
Assim se compram as pessoas, assim são alienadas as pessoas.

Próximo!!



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