Estou com os azuis
(Crónica do quotidiano)
She calls across the seaThrough autumn rains
She screams
She howls in ecstasy
She calls
She calls through wind and rain
"She Calls", Slowdive
As manhãs luminosas lembram-me o perfume que se pressentia quando chegava à escola. Subíamos a Rua da Devesa e o cimento dos prédios rosa dava - sinto-o agora - a cor que não estava lá. Desmaiada por entre os crescentes ruídos do tráfego de uma via lateral e que para nós, enquanto peões, pouco existia.
Sentir esse cheiro da manhã brilhante é lembrar a flor de laranjeira que secou.
Hoje, passo por outras ruas, que se tornaram sempre as mesmas. Num espaço fechado e anti-comercial um papel à entrada sugere-nos que circulemos. E no absurdo de fugir ao estarmos parados, caímos na subversão dos que por contemplarem ordens não as cumprem. Acaso seremos marginais?
Vejo os espaços ocupados, tenho de fazer desvios, porque o caminho está barrado, porque é privado, ou porque tem carros. Ou porque vivemos em becos que se multiplicam. Se for preciso piso a relva. Não teria sido o único. Nesse canteiro-oásis de caniches não se cultivará nunca o espelho das nossas aspirações.
(Quando as cidades perderem de vez o carácter lúdico, cívico e habitacional, mandará a ASAE encerrá-las por nelas não dispormos de silêncio, ar puro e espaços verdes?)
Passo por entre crianças que não têm espaço para brincar.
E detenho-me a pensar onde se namora nos dias e nos lugares que correm.
Escondidos numas escadas do Campo Novo, sentados num muro de mármore dos Granjinhos, a meio do estreito e alvo corredor do Braga Parque, numa esplanada de café. Ou então, num banco de uma qualquer praça de empedrado junto à igreja, capela ou museu, sobre húmidos frios graníticos de outonos que despontam.
Reconheço os tempos de recolhimento e sei que algumas memórias hibernam. Porque, às vezes, quando paramos, sentimo-nos a retroceder.
E em entardeceres azuis sinto o cheiro de manhãs que não voltam.
Sentir esse cheiro da manhã brilhante é lembrar a flor de laranjeira que secou.
Hoje, passo por outras ruas, que se tornaram sempre as mesmas. Num espaço fechado e anti-comercial um papel à entrada sugere-nos que circulemos. E no absurdo de fugir ao estarmos parados, caímos na subversão dos que por contemplarem ordens não as cumprem. Acaso seremos marginais?
Vejo os espaços ocupados, tenho de fazer desvios, porque o caminho está barrado, porque é privado, ou porque tem carros. Ou porque vivemos em becos que se multiplicam. Se for preciso piso a relva. Não teria sido o único. Nesse canteiro-oásis de caniches não se cultivará nunca o espelho das nossas aspirações.
(Quando as cidades perderem de vez o carácter lúdico, cívico e habitacional, mandará a ASAE encerrá-las por nelas não dispormos de silêncio, ar puro e espaços verdes?)
Passo por entre crianças que não têm espaço para brincar.
E detenho-me a pensar onde se namora nos dias e nos lugares que correm.
Escondidos numas escadas do Campo Novo, sentados num muro de mármore dos Granjinhos, a meio do estreito e alvo corredor do Braga Parque, numa esplanada de café. Ou então, num banco de uma qualquer praça de empedrado junto à igreja, capela ou museu, sobre húmidos frios graníticos de outonos que despontam.
Reconheço os tempos de recolhimento e sei que algumas memórias hibernam. Porque, às vezes, quando paramos, sentimo-nos a retroceder.
E em entardeceres azuis sinto o cheiro de manhãs que não voltam.
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